Nesta sexta-feira, 21/03, finalmente estréia no Brasil o filme “I´m Not There”, do talentoso diretor da nova geração do cinema americano, Todd Haynes. O filme, muito além de uma cinebiografia, é uma representação livre do universo de Bob Dylan e suas diversas facetas: jovem poeta, ícone do movimento folk, roqueiro rebelde, cristão convertido, caubói solitário e, sobretudo, porta-voz de toda uma geração. Um artista cujas revoluções musicais e estéticas foram um espelho das transformações no mundo ao longo de todos esses anos. Ao longo do filme, Haynes procura evitar reduzir Dylan a um tipo facilmente definível e dá uma idéia da dificuldade de classificar o mito. Para tanto, ousa fazer com que seis atores interpretem as diversas fases e aspectos diferentes da vida do artista: Christian Bale, Cate Blanchett, Marcus Carl Franklin, Richard Gere, Heath Ledger (falecido recentemente) e Ben Wishaw são todos Bob Dylan, ou alter-egos de Bob Dylan... Para alguns críticos, tudo não passa de um delírio do diretor, mas a maioria recebeu bem o filme, nas pré-estréias e festivais espalhados pelo planeta, como um retrato poético e surreal do maior compositor popular de todos os tempos, uma visão completa e multifacetada do mito. É bem verdade que os atores ajudam muito. Eles vivem personagens com nomes diferentes, que fazem referência às diversas influências e passagens da vida do biografado, porém fica muito evidente que representam fases ou facetas de um mesmo homem. Todos em atuações acima da média, encarnam o homem, a criança, o poeta, o cantor, o rebelde... Todos num único sujeito, num artista que se reinventa e que tudo o que quis, foi tradurzir-se em suas próprias canções... Nesse aspecto, o filme atende perfeitamente ao propósito. Bob Dylan é um artista em constante transformação, mas ao mesmo tempo, um homem coerente com certos princípios básicos. I´m Not There é de uma poesia moderna, que foge à métrica tradicional, mas que encanta justamente por isso. Genial a maneira que Todd Haynes nos mostra a vida, as músicas, a obra de Bob Dylan. O próprio título do filme ajuda nesse contexto. “Não estou lá”. É como se o próprio Dylan nos dissesse: -“É assim que vocês me vêem, mas eu não estou ali, parado, imóvel. Estou em constante movimento, estou por aí, em transformação, sou múltiplos de mim mesmo...” Haynes não procura simplesmente captar as metamorfoses de Dylan. Ele vai além. Para cada faceta do músico, há um estilo diferente. É como se fossem episódios de um mesmo filme, mas incrivelmente, embora as partes sejam dissonantes entre si, a harmonia do todo resta preservada. A fotografia inclusive, é um dos pontos altos do filme. Ora em preto e branco, ora num colorido onde sobressaem vários tons de amarelo. É bem verdade que o filme irá agradar principalmente aos fãs de Bob Dylan. Para quem nunca leu nada a respeito da trajetória do músico, o filme pode parecer um pouco confuso. Mesmo assim, vale a pena assisti-lo. É um projeto ambicioso, desafiador, mas atores e diretor conseguem suplantar todos os obstáculos, buscando uma maneira criativa de não aprisionar o biografado. “I´m Not There” é um filme arrebatador, que não se encerra num nicho fechado. Um filme, assim como o artista em tela, múltiplo e singular!
terça-feira, 18 de março de 2008
No Direction Home
“Ele é um neurótico!”, gritava uma jovem, na saída do Albert Hall, após a apresentação de Bob Dylan. “Nós viemos aqui para ver um artista folk, não uma banda de rock”, vociferava um rapaz, no meio de um grupo, na saída do teatro. “Eu quase enlouqueci com essa banda tocando tão alto”, revelava mais outro fã inconsolável. Os depoimentos eram um retrato sem retoque do que parecia ser o de um “judas” que havia traído as suas raízes e abandonado a música de protesto para virar uma espécie de último beatnik . O choque causado pela mudança de estilo do compositor de “Blowin' In The Wind” é o cerne de No Directon Home , documentário dirigido por Martin Scorcese sobre o período mais turbulento da carreira de Dylan — que coincidiu com momentos importantes da história dos Estados Unidos: Crise dos Mísseis, Martin Luther King, Kennedy e o Vietnã.
O filme, que começa e termina com as imagens marcantes da malfadada turnê européia do mais popular folk singer de sua geração, mostrando a perlplexidade tanto da platéia, que não entendia o porque daquele set com uma banda de rock no fim da apresentação acústica, entremeada por apupos e palavras de ordem quando a do autor de “Like a Rolling Stone”, ao ter que responder, a repórteres ligeiramente despreparados ou que não conhecessem qualquer disco seu, perguntas tão absurdas quanto as suas respostas:
Repórter: quantas pessoas do seu meio musical que também fazem canções de protesto?
Dylan: Você quer saber quantos?
Repórter: Sim, quantos?
Dylan: Bom, acho que uns centro e trinta e seis (risos abafados).
Repórter: Você acha que são cerca de cento e trinta e seis?
Dylan: Certamente uns centro e trinta e seis. Ou cento e quarenta e dois! Rá, rá.
Xodó - Corte para Dulluth, quando o documentário se volta para o começo da carreira de Bob Dylan. Ele tateava por um estilo musical e, vendo que o rock vivia uma situação adversa, encontrou terreno fértil no folk , quando descobre diversos artistas de folk, blues e gospel, como Ma Rainey, Leadbelly, Odetta, Billie Holliday, Hank Williams, John Jacob e Woody Guthrie. Resolve absorver tudo aquilo e partir para Nova Iorque onde, após uma marcante incursão pelo universo boêmio de Greenwich Village — muito bem retratado por Scorcese –, ele consegue apresentar-se em pequenos cafés, até chegar ao disco, em 1961. Após o discreto début no primeiro álbum, gravando principalmente standards de folk e blues, ele vira ícone da noite para o dia com “Blowin'In The wind” e se transforma em uma espécie de xodó das esquerdas.
Para eles, Bob era mais do que um cantor de protesto, com letras simples e simplórias, mas tinha um magnetismo pessoal, e uma capacidade impressionante de criar a trilha sonora do que era a luta dos movimentos sociais norte-americanos pelos Direitos Civis. Em menos de um ano, o cantor era figura de proa de um movimento que tinha pretensões mais políticas do que meramente musicais. Mais do que isso, Dylan demonstrava, como é evidente no documentário, uma antena da raça. “Ela absorvia tudo”, diz Tony Glover, num trecho do documentário. “Ele pagava cada elemento, cada maneirismo, cada acento que achasse importante e adicionava tudo à sua música”, revela.
Scorcese inclui sutilezas ao contextualizar Dylan à sua época. Tempos politicamente confusos, onde havia segregação racial, o trauma de um país inteiro com o assassinato de Kennedy (que é mostrado em tela tendo ao fundo “A Hard Rain's A Gonna Fall”), o medo da ameaça nuclear e a morte de civis e de militares ianques no Vietnã. Dylan foi identificado, rotulado, embalado e vendido como produto de protesto e bandeira incendiária de movimentos identificados com a esquerda, ao mesmo tempo em que era guindado aos píncaros azulados do sucesso comercial, e transformado em ídolo do Newport Folk Festival.
Escândalo - O momento mais tenso de No Direction Home desvenda o processo de mudança da postura do compositor como artista, a influência beatnik (inclusive de Allan Ginsberg, que fornece depoimentos importantes). Ao mesmo tempo em que se dedica cada vez mais à prosa, escrevendo caudalosamente numa máquina de escrever portátil, ele passa a absorver a literatura de Blake, Ginsberg e Kerouac na mesma medida em que entronizara Gutherie no começo de sua breve carreira. Agora era outro: cabelos longos, rosto cavo, óculos escuros, letras gigantescas e dantescas. O homem que era a voz de uma geração, o cantor de protesto, o xodó das esquerdas resolve reproduzir na sagrada Bayreuth de Newport o som que descobria em estúdio, ao plugar o seu canto e moldurá-lo à guitarras rascantes pianos honk tonk.
Assim, Dylan eletrifica o seu som e choca a comunidade folkie . Escândalo geral. A apresentação não dura quinze minutos. No fim do show, Bob descobre que Pete Seeger, cantor e compositor que tanto admirava, queria cortar a eletricidade com um machado. Mais tarde naquela noite, durante a festa, Maria Maudaur tenta animar Dylan: “você quer dançar?”. “adoraria dançar com você”, diz o cantor. “Mas as minhas mãos estão em fogo!”, ele devolve, entre inconsolável e enigmático.
Como a mão que afaga é a mesma que apedreja, de repente, ao eletrificar o seu som, o messias das esquerdas vira o vilão da história. Ao mesmo tempo em que precisa afirmar as suas posições e ser cobrado por abandonar o protesto (que, segundo Joan Baez explica, nunca foi a tônica na personalidade do Dylan como pessoa) , ele tenta reafirmar a sua nova música, calcada no rock, com Mike Bloomfield como seu lead guitar e Robbie Robertson e a embrionária The Band no palco. Enquanto o produtor de folk Harold Leventhal conta o seu desencanto com os acontecimentos de Newport, Baez revela que sentia que seu parceiro musical vislumbrava um público maior e menos restrito do que aquele. “sempre que eu ia à passatas, as pessoas me perguntavam: o Bob virá? Eu dizia: não, seu tolo, ele não virá, ele nunca esteve aqui, ele nunca viria”.
Expedicionário musical - O choque com a imprensa é inevitável. “Você sabe por que você é famoso?”, pergunta um jornalista. “Você acredita no que você canta?”. Dado momento, um lasca: “Você vai àquela manifestação, à noite?”. Ele pega o microfone diz: “eu estarei ocupado esta noite”. Scorcese faz uma antologia de coletivas onde Dylan é fuzilado com pistolas de esguicho, disparadas por repórteres tanto autorais como despreocupadas. “Você acha que é o último beatnik?”. “O que quer dizer aquela motocicleta em sua camiseta?”. Um graceja, entre flashes: “Os seus primeiros discos eram bem melhores!”. “De onde você é?”, pergunta o compositor. “Sou francês”, revela o jornalista. “É por isso que você prefere os primeiros”, ri o ilustre entrevistado.
O Dylan de agora dialoga consigo e relembra os eventos, dizendo: “eu era um expedicionário musical”. Essa era a chave para entendê-lo. Joan Baez, também em retrospectiva, entende que, naqueles tempos, qualquer pessoa que fosse uma figura pública precisava estar em um lado: “ou você estava do lado do governo, ou estava do lado de [Martin Luther] King. Ou estava do lado do Vietnã, ou estava contra”. Bob foi colocado de um lado que nunca esteve, e o acusado de mudar de lado. Esse é o ponto crucial da tese de Scorcese: a sua leitura é a do artista incompreendido, cuja arte deveria apontar para alguma direção, principalmente alguma direção política. A visão do diretor aponta para a direção do outsider , do artista rotulado, vaiado, rejeitado, cuja apoteose é a vaia. “Você vai voltar, Bob?”, pergunta uma fã. “quero saber quem me vaiou”, diz Dylan.. “Me dê um autógrafo”, implora um garoto. “Você não precisa do meu autógrafo”, graceja o cantor. “Se precisasse, eu lhe daria”. “O que é que ele tem hoje??”, ri o garoto, enquanto carro vai embora.
“Onde está Woody, Bob??”, desafia alguém na platéia, em Endiburgo, numa das cenas recorrentes de No Direction Home : a tumultuada turnê britânica, que abre e fecha o filme. “Judas!”, grita um. “E as músicas de protesto, Bob?”. “Estas são música de protesto, pessoal, então, por favor”, defende-se Dylan, ao microfone.
Ginsberg flagra encontro entre Dylan e os Beatles num hotel em Londres, em 1965, quando o poeta era deportado da Thecoslováquia, e parou na capital inglesa. Ele revela que não conhecia os Beatles pessoalmente, mas como tinha contato com o Dylan, ficou ao lado dele. De repente, resolveram quebrar o gelo. Allan pergunta a John Lennon: "você já leu William Blake?". John respondeu: "nunca". Ao que Cyntia, sua esposa, responde: "John, não seja mentiroso!". E todos riram. Allan não escondeu que, ao ver aquele pessoal todo que estava no auge do sucesso em todos os sentidos, no fundo, demostrava estar meio que perdido, sem saber o que fazer com tudo aquilo.
Bob não sabia o que fazer com o ônus de pagar a opção por traçar o seu caminho como compositor e tentar conduzir o seu talento a alçar outros vôos. Ele não queria ser lembrado como o “cantor de protesto”, não se importa com aqueles que o malharam. Maria Maudaur mata a charada: “Ele queria que o público viesse a ele, não o inverso”.
O filme, que começa e termina com as imagens marcantes da malfadada turnê européia do mais popular folk singer de sua geração, mostrando a perlplexidade tanto da platéia, que não entendia o porque daquele set com uma banda de rock no fim da apresentação acústica, entremeada por apupos e palavras de ordem quando a do autor de “Like a Rolling Stone”, ao ter que responder, a repórteres ligeiramente despreparados ou que não conhecessem qualquer disco seu, perguntas tão absurdas quanto as suas respostas:
Repórter: quantas pessoas do seu meio musical que também fazem canções de protesto?
Dylan: Você quer saber quantos?
Repórter: Sim, quantos?
Dylan: Bom, acho que uns centro e trinta e seis (risos abafados).
Repórter: Você acha que são cerca de cento e trinta e seis?
Dylan: Certamente uns centro e trinta e seis. Ou cento e quarenta e dois! Rá, rá.
Xodó - Corte para Dulluth, quando o documentário se volta para o começo da carreira de Bob Dylan. Ele tateava por um estilo musical e, vendo que o rock vivia uma situação adversa, encontrou terreno fértil no folk , quando descobre diversos artistas de folk, blues e gospel, como Ma Rainey, Leadbelly, Odetta, Billie Holliday, Hank Williams, John Jacob e Woody Guthrie. Resolve absorver tudo aquilo e partir para Nova Iorque onde, após uma marcante incursão pelo universo boêmio de Greenwich Village — muito bem retratado por Scorcese –, ele consegue apresentar-se em pequenos cafés, até chegar ao disco, em 1961. Após o discreto début no primeiro álbum, gravando principalmente standards de folk e blues, ele vira ícone da noite para o dia com “Blowin'In The wind” e se transforma em uma espécie de xodó das esquerdas.
Para eles, Bob era mais do que um cantor de protesto, com letras simples e simplórias, mas tinha um magnetismo pessoal, e uma capacidade impressionante de criar a trilha sonora do que era a luta dos movimentos sociais norte-americanos pelos Direitos Civis. Em menos de um ano, o cantor era figura de proa de um movimento que tinha pretensões mais políticas do que meramente musicais. Mais do que isso, Dylan demonstrava, como é evidente no documentário, uma antena da raça. “Ela absorvia tudo”, diz Tony Glover, num trecho do documentário. “Ele pagava cada elemento, cada maneirismo, cada acento que achasse importante e adicionava tudo à sua música”, revela.
Scorcese inclui sutilezas ao contextualizar Dylan à sua época. Tempos politicamente confusos, onde havia segregação racial, o trauma de um país inteiro com o assassinato de Kennedy (que é mostrado em tela tendo ao fundo “A Hard Rain's A Gonna Fall”), o medo da ameaça nuclear e a morte de civis e de militares ianques no Vietnã. Dylan foi identificado, rotulado, embalado e vendido como produto de protesto e bandeira incendiária de movimentos identificados com a esquerda, ao mesmo tempo em que era guindado aos píncaros azulados do sucesso comercial, e transformado em ídolo do Newport Folk Festival.
Escândalo - O momento mais tenso de No Direction Home desvenda o processo de mudança da postura do compositor como artista, a influência beatnik (inclusive de Allan Ginsberg, que fornece depoimentos importantes). Ao mesmo tempo em que se dedica cada vez mais à prosa, escrevendo caudalosamente numa máquina de escrever portátil, ele passa a absorver a literatura de Blake, Ginsberg e Kerouac na mesma medida em que entronizara Gutherie no começo de sua breve carreira. Agora era outro: cabelos longos, rosto cavo, óculos escuros, letras gigantescas e dantescas. O homem que era a voz de uma geração, o cantor de protesto, o xodó das esquerdas resolve reproduzir na sagrada Bayreuth de Newport o som que descobria em estúdio, ao plugar o seu canto e moldurá-lo à guitarras rascantes pianos honk tonk.
Assim, Dylan eletrifica o seu som e choca a comunidade folkie . Escândalo geral. A apresentação não dura quinze minutos. No fim do show, Bob descobre que Pete Seeger, cantor e compositor que tanto admirava, queria cortar a eletricidade com um machado. Mais tarde naquela noite, durante a festa, Maria Maudaur tenta animar Dylan: “você quer dançar?”. “adoraria dançar com você”, diz o cantor. “Mas as minhas mãos estão em fogo!”, ele devolve, entre inconsolável e enigmático.
Como a mão que afaga é a mesma que apedreja, de repente, ao eletrificar o seu som, o messias das esquerdas vira o vilão da história. Ao mesmo tempo em que precisa afirmar as suas posições e ser cobrado por abandonar o protesto (que, segundo Joan Baez explica, nunca foi a tônica na personalidade do Dylan como pessoa) , ele tenta reafirmar a sua nova música, calcada no rock, com Mike Bloomfield como seu lead guitar e Robbie Robertson e a embrionária The Band no palco. Enquanto o produtor de folk Harold Leventhal conta o seu desencanto com os acontecimentos de Newport, Baez revela que sentia que seu parceiro musical vislumbrava um público maior e menos restrito do que aquele. “sempre que eu ia à passatas, as pessoas me perguntavam: o Bob virá? Eu dizia: não, seu tolo, ele não virá, ele nunca esteve aqui, ele nunca viria”.
Expedicionário musical - O choque com a imprensa é inevitável. “Você sabe por que você é famoso?”, pergunta um jornalista. “Você acredita no que você canta?”. Dado momento, um lasca: “Você vai àquela manifestação, à noite?”. Ele pega o microfone diz: “eu estarei ocupado esta noite”. Scorcese faz uma antologia de coletivas onde Dylan é fuzilado com pistolas de esguicho, disparadas por repórteres tanto autorais como despreocupadas. “Você acha que é o último beatnik?”. “O que quer dizer aquela motocicleta em sua camiseta?”. Um graceja, entre flashes: “Os seus primeiros discos eram bem melhores!”. “De onde você é?”, pergunta o compositor. “Sou francês”, revela o jornalista. “É por isso que você prefere os primeiros”, ri o ilustre entrevistado.
O Dylan de agora dialoga consigo e relembra os eventos, dizendo: “eu era um expedicionário musical”. Essa era a chave para entendê-lo. Joan Baez, também em retrospectiva, entende que, naqueles tempos, qualquer pessoa que fosse uma figura pública precisava estar em um lado: “ou você estava do lado do governo, ou estava do lado de [Martin Luther] King. Ou estava do lado do Vietnã, ou estava contra”. Bob foi colocado de um lado que nunca esteve, e o acusado de mudar de lado. Esse é o ponto crucial da tese de Scorcese: a sua leitura é a do artista incompreendido, cuja arte deveria apontar para alguma direção, principalmente alguma direção política. A visão do diretor aponta para a direção do outsider , do artista rotulado, vaiado, rejeitado, cuja apoteose é a vaia. “Você vai voltar, Bob?”, pergunta uma fã. “quero saber quem me vaiou”, diz Dylan.. “Me dê um autógrafo”, implora um garoto. “Você não precisa do meu autógrafo”, graceja o cantor. “Se precisasse, eu lhe daria”. “O que é que ele tem hoje??”, ri o garoto, enquanto carro vai embora.
“Onde está Woody, Bob??”, desafia alguém na platéia, em Endiburgo, numa das cenas recorrentes de No Direction Home : a tumultuada turnê britânica, que abre e fecha o filme. “Judas!”, grita um. “E as músicas de protesto, Bob?”. “Estas são música de protesto, pessoal, então, por favor”, defende-se Dylan, ao microfone.
Ginsberg flagra encontro entre Dylan e os Beatles num hotel em Londres, em 1965, quando o poeta era deportado da Thecoslováquia, e parou na capital inglesa. Ele revela que não conhecia os Beatles pessoalmente, mas como tinha contato com o Dylan, ficou ao lado dele. De repente, resolveram quebrar o gelo. Allan pergunta a John Lennon: "você já leu William Blake?". John respondeu: "nunca". Ao que Cyntia, sua esposa, responde: "John, não seja mentiroso!". E todos riram. Allan não escondeu que, ao ver aquele pessoal todo que estava no auge do sucesso em todos os sentidos, no fundo, demostrava estar meio que perdido, sem saber o que fazer com tudo aquilo.
Bob não sabia o que fazer com o ônus de pagar a opção por traçar o seu caminho como compositor e tentar conduzir o seu talento a alçar outros vôos. Ele não queria ser lembrado como o “cantor de protesto”, não se importa com aqueles que o malharam. Maria Maudaur mata a charada: “Ele queria que o público viesse a ele, não o inverso”.
Por Marcelo Xavier
highway61@bol.com.br
Originalmente publicado em “Rabisco – Revista de Cultura Pop”
http://www.rabisco.com.br/72/direction_home.htm
Aproveito o belo texto do Marcelo, aí em cima, pra recomendar o DVD "No Direction Home", do Martin Scorsese, por apenas R$ 12,99 em promoção das Lojas Americanas.
Boteco Dylanesco
Se você ainda não conhece, precisa conferir. Existe uma comunidade no Orkut onde há vida inteligente... É o Boteco Dylanesco, um espaço que se tornou ponto de encontro de amigos que se conheceram na comunidade do Bob Dylan e o utilizam para falar de assuntos diversos, dylanescos ou não. Lá, a regra é não ter regras. Falamos sobre cultura; cinema; música; viagem; política; enfim, um pouco de tudo e principalmente de Bob Dylan. Vale a pena dar uma conferida. O endereço é:
Alguns vídeos
Não sei se já conhecem, mas fuçando a internet em busca de matérias sobre o Dylan, encontrei estes videozinhos do YouTube, num Blog espanhol dedicado ao Bob, que gostaria de compartilhar com os amigos.
Pelas informações que obtive, poucas e imprecisas, o primeiro é de um filme para TV, sobre a Guerra Civil norte-americana, "Gods and Generals"; o segundo, uma versão do clássico "A Hard Rain´s A-Gonna Fall", gravado especialmente para a Expo Universal de Zaragoza; O terceiro, apresenta a canção "Huck's Tune", incluida no filme "Lucky You" e o último, com a canção folk "Tell Ol' Bill".
Aqui vão os links:
http://es.youtube.com/watch?v=A-op0vyUhkE
http://es.youtube.com/watch?v=hTjSFRW_icE&feature=related
http://es.youtube.com/watch?v=gcYpESn8Ako
http://es.youtube.com/watch?v=XujoLHNSbGs
http://es.youtube.com/watch?v=hTjSFRW_icE&feature=related
http://es.youtube.com/watch?v=gcYpESn8Ako
http://es.youtube.com/watch?v=XujoLHNSbGs
Quem tiver maiores informações, que dê sua contribuição...
Eu estava lá...
A última vez que Bob Dylan se apresentou no Brasil havia sido em 1998 e naquela oportunidade, compromissos profissionais me impediram de vê-lo. Muitos anos depois, já em 2005, ingressei num site de relacionamentos na internet e, apesar de no início achá-lo sem graça, algumas comunidades de discussão relacionadas ao meu artista favorito, me fizeram utilizá-lo até com certa freqüência. Em meu círculo de convivência, não são muitos os fãs e admiradores do cantor e poeta, ícone do movimento folk. Na internet, pude conhecer pessoas que curtiam as mesmas canções e, principalmente, conheciam muito a obra do grande Dylan. Foi um achado e tornou-se um constante aprendizado! Nestas comunidades, a cada ano surgiam boatos sobre o retorno do ídolo ao país, mas infelizmente isto nunca se concretizava. Já quase sem esperanças de novamente ter a oportunidade de ver o homem-lenda em terras tupiniquins, eis que surge o anúncio oficial dos shows de Bob Dylan no Rio e São Paulo. Devo ter sido, provavelmente, um dos primeiros a adquirir os ingressos pela internet e, numa tremenda ansiedade, começar os preparativos para a viagem que sabia ser inesquecível.
Um sonho acalentado durante anos estava prestes a se tornar realidade. Em março de 2008, finalmente, Mr. Bob Dylan em pessoa, ao vivo e em cores, estaria novamente em palcos brasileiros e desta vez, eu estaria lá... A companheira de viagem seria minha namorada Camila, que se não chega a ser fã do mestre, graças ao convívio comigo passou a curtir e admirar aquele que ela chama, carinhosamente, de “velhinho fanho e narigudo”. Os altíssimos preços dos ingressos, caríssimos em São Paulo e apenas um pouco mais em conta no Rio, forçaram que os demais custos da viagem fossem bastante reduzidos. As passagens para São Paulo foram compradas numa mega-promoção de companhia aérea, enquanto que as pro Rio, através de programa de milhagens. Os hotéis onde nos hospedaríamos foram escolhidos não pelo conforto ou localização, mas levando em consideração tão somente as tarifas mais baixas disponíveis. A viagem era meu próprio presentinho de aniversário, a recompensa por estar chegando aos 40 anos, que seriam completados exatamente no dia da apresentação do mito na arena do Rio de Janeiro.
O show em São Paulo foi numa quarta-feira, 05/03, numa casa de espetáculos ampla e elegante. Os problemas eram as mesinhas apertadas e quase nenhum espaço para se locomover entre elas, além de um serviço de má qualidade. Mais uma decepção viria quando anunciaram que, durante a apresentação, os telões que ficavam ao lado do palco seriam desligados. Nossos lugares eram um pouco distantes do palco e, embora tivéssemos boa visão panorâmica deste, os telões ajudariam em muito a enxergar e perceber os detalhes, as expressões dos músicos, especialmente do Bob, que à distância parecia estar se divertindo a valer. De todo modo, todos os transtornos foram devidamente esquecidos, quando apenas dois minutinhos após o horário previsto, o mestre já se encontrava no palco e os primeiros acordes de "Leopard-Skin Pill-Box Hat" já eram ouvidos no Via Funchal... Em êxtase, ainda um pouco aturdido e sem acreditar que aquilo estava mesmo acontecendo, fomos acompanhando uma a uma, por quase duas horas, as canções do mestre, que alternou entre clássicos como “Like a Rolling Stone”; “It Ain´t Me Baby” e “Highway 61 Revisited” e canções mais recentes, em especial do último disco, “Modern Times”. Sim, é verdade tudo aquilo que já sabíamos de tanto ler, ouvir falar ou mesmo escutar os antigos discos “ao vivo”: que ele modifica os arranjos das músicas, que às vezes demoramos um pouco para identificar qual canção está sendo tocada, que ele altera o andamento e por vezes até as letras das músicas... Mas nada disso compromete o espetáculo. Pelo contrário, é justamente o que faz de cada show de Bob Dylan um evento único e exclusivo e é também aquilo que o caracteriza como um artista em constante mutação, sempre à frente do seu tempo. Talvez, a maior característica das apresentações dessa legenda da música internacional, seja o fato de poder pinçar qualquer seleção de músicas das cerca de 500 canções de seu repertório e tocá-las de modo todo particular. Sexta-feira seguiríamos pro Rio de Janeiro, que aliás, continua lindo e no sábado, 8 de março, dia do meu 40º aniversário, estaríamos novamente diante do ícone, do poeta que, quando jovem, foi apontado como “a voz de sua geração”, mas que com quase 70 anos ainda se mostra em ótima forma, com muita energia e vitalidade.
Não preciso dizer que este foi meu aniversário mais marcante e ainda que o “bardo” não tenha tocado um “Happy Birthday to Me”, ao menos me presenteou com uma lindíssima interpretação de “My Back Pages”: “Ah but I was so much older then, I´m younger than that now.” A Rio Arena, construída para os Jogos Pan-Americanos do ano passado, era uma estrutura bem melhor para um show daquele porte e, embora na arquibancada, ficamos nas proximidades do palco e tínhamos ótima visão do show. Cadeiras confortáveis, amplo espaço para assistir o espetáculo sem precisar nos espremer, liberdade de circulação e um clima mais descontraído, já revelavam que o show do Rio superaria o de São Paulo. Mais uma vez, o velho Bob mesclaria velhas canções, clássicos como “Blowin´ in the Wind” que encerrou sua passagem pelo Brasil, com músicas mais recentes, dentre as quais, “Things Have Changed” que rendeu ao Dylan um Oscar, cuja estatueta reluzia no palco, bem próxima aos teclados usados pelo mestre.
Ao final de tudo, além das lembranças das apresentações do homem-lenda, que jamais se apagarão da memória, trago também recordações de alguns amigos que até então eram apenas virtuais, mas que tivemos a grata satisfação de conhecer pessoalmente. Em São Paulo, na Via Funchal, o gaúcho-gremista Sidnei, com sua indefectível camisa do tricolor dos pampas, com o nome do Bob Dylan e o nº 10 às costas. No dia seguinte ao show, num botequim da Av. Faria Lima, um encontro descontraído, regado a muita cerveja e ótimo bate-papo, com os paulistas Carmênio José; Morgana e Maristela. No Rio, em pleno show, nos encontramos com Juliano Franco, um garotão com a idade de meu filho Victor (17 anos), mas já completamente apaixonado e conhecedor da inesgotável obra do legendário Bob Dylan. Na saída do Rio Arena, um encontro casual com meu conterrâneo Guilherme, com quem apenas mantinha contato através de mensagens eletrônicas. Todos estes, inclusive alguns que faltaram e suas ausências se fizeram sentir, são personagens desta história, desta experiência única e maravilhosa do meu encontro com este artista também único e inconfundível chamado Robert Allen Zimmerman, mas que o mundo inteiro conhece por BOB DYLAN!
Escrito a bordo de um avião Varig, trajeto Rio-Recife, em 10 de março de 2008.
Abertura
Olá pessoal! Esta é a primeira postagem desse Blog que criei, inteiramente dedicado ao meu artista favorito, Bob Dylan. Neste mês de março, em virtude da passagem do meu 40º aniversário, me dei de presente uma viagem a São Paulo e Rio de Janeiro, para acompanhar as apresentações do bardo no Brasil. Dois shows maravilhosos e inesquecíveis, o primeiro, no dia 05/03 na Via Funchal-SP e em seguida, 08/03 na Rio Arena, recentemente construída para os Jogos Pan-Americanos.
A emoção de ver o ídolo ao vivo e em toda sua magnitude, me despertou o desejo de criar esse Blog para compartilhar com os amigos alguns textos, notícias, fotos, links, vídeos e tudo o mais que diga respeito à vida e carreira de Bob Dylan!
Espero contar com a contribuição de todos. Obrigado!!!
A emoção de ver o ídolo ao vivo e em toda sua magnitude, me despertou o desejo de criar esse Blog para compartilhar com os amigos alguns textos, notícias, fotos, links, vídeos e tudo o mais que diga respeito à vida e carreira de Bob Dylan!
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